Vigorexia e o Transtorno Dismórfico Corporal
Quando o corpo se torna uma obsessão
A maior parte das pessoas poderá ter pensamentos mais ou menos razoáveis sobre a sua aparência e estarem satisfeitas com o que vêem ao espelho, mas algumas desenvolvem uma crença que possuem um defeito grave no seu aspecto, ao ponto de se preocuparem continuamente, com sofrimento, e até prejudicar a sua vida profissional e social, ao evitarem situações onde alguém se poderia aperceber do seu “grave” defeito…
Assim, estes pensamentos críticos podem incidir sobre alguma parte do corpo, como o nariz, a face, o cabelo, os seios, a anca ou o formato da cabeça. Se esta preocupação for claramente excessiva, provocar um sofrimento importante, prejudicar as várias áreas da vida do indivíduo e estes pensamentos forem intrusivos (involuntarios e persistentes) poderá existir um Transtorno Dismórfico Corporal.
Por outro lado, a preocupação excessiva pode incidir sobre o corpo e o seu grau de musculatura. A vigorexia pode ser caracterizada como um problema psicológico quando existe uma distorção na auto-imagem corporal: o individuo vê-se como mais fraco, menos muscular ou mais pequeno do que aquilo que realisticamente é.
Assim, existe uma convicção (irrealista) de que é fraco, pequeno ou inferior e compulsivamente vai realizar intensos exercícios físicos para atingir um suposto ideal de corpo físico.
Na vigorexia, ou complexo de adónis, como o autor deste conceito chama, Harrison Pope, existem crenças fortes e preocupações acerca da aparência e da musculatura. Pode ser considerado uma forma de transtorno obsessivo- compulsivo, apesar de também se relacionar com as características dos transtornos alimentares.
Pode ser considerado um problema se existirem um conjunto de sintomas:
- A preocupação com um defeito imaginado na aparência ou no corpo domina a maior parte do tempo
- Causar um prejuízo ou stress significativo na vida social ou laboral do indivíduo, devido à sua preocupação
- Intensa frustração e raiva se não poder fazer os treinos no ginásio
- Observar constantemente o corpo e procurar defeitos
- Preocupação constante em aumentar a massa muscular e definição, mesmo sendo muito mais forte do que a média das pessoas
- Comparação constante com outras pessoas e um sentimento de intensa inferioridade se não corresponder a um padrão irrealista (só obtido com muitos suplementos alimentares e mesmo com substâncias ilegais)
A origem pode ter a ver com uma combinação de factores: aprendizagens precoces, em que foi humilhado ou inferiorizado pelos outros (na família ou escola), personalidade obsessiva e perfecionista, certas características de personalidade como uma grande necessidade de aprovação pelos outros, uma baixa auto- estima, compensada pela ilusão da aprovação que o corpo poderia proporcionar, ansiedade generalizada e mesmo pela influência de certos padrões culturais vinculados em revistas de culturismo, brinquedos (como os boncos de super heróis) , televisão ou publicidade, criando uma ilusão de objetivo a atingir ou ideal de sucesso social.
Este problema parece começar de uma forma gradual e subtil, até que se torna uma preocupação central na vida dessa pessoa. Sinais possíveis poderão ser quando o indivíduo fixa como a sua preocupação principal o treino no ginásio e a alimentação, negligenciando tudo o resto, como a família, emprego ou relações pessoais; não conseguir deixar de se preocupar com o tamanho do corpo, procurar constantemente certificar-se de que está com o tamanho adequado e comparar-se com os outros.
Como existe uma distorção na forma de ver e interpretar o próprio corpo, muitas vezes o indivíduo não se apercebe do excesso de preocupação, dos riscos que corre ao treinar demasiado e com drogas ilegais, nem da diferença entre aquilo que interpreta e o corpo real (à semelhança com a anorexia), em que mesmo possuindo uma grande musculatura, ve-se como pequeno ou fraco. É raro procurarem ajuda.
Parecem existir algumas características frequentes nas pessoas com vigorexia: perfecionismo, grande preocupação com o corpo ou com algum defeito físico (como nariz grande ou o cabelo), extrema necessidade de aprovação pelos outros, percepção de ser inadequado socialmente, grande preocupação com a aparência, medo de ser fraco, imaturo ou “pouco masculino”, sentimentos de inferioridade, baixa auto estima, muita atenção e vigilância ao próprio corpo e ao desempenho social e até predisposições biológicas.
Parece ser mais comum por volta dos 20 anos. Pode levar a transtornos de ansiedade e depressão, ao isolamento social e a um alheamento das actividades sociais e laborais, pela preocupação e tempo que esta obsessão exige. No limite, pode levar ao consumo de drogas ilegais que poderão ser fatais.
Para o diagnóstico correcto, existem questionários que permitem avaliar a satisfação corporal, o desejo pela musculatura, e o grau do transtorno dismórfico muscular. Pode haver uma avaliação médica, com exames físicos e apoio do nutricionista.
O tratamento cognitivo- comportamental é o mais eficaz. Ele procura corrigir os padrões erróneos de pensamento, que estão na origem das possíveis causas do transtorno cognitivo que cria um ciclo vicioso de pensamento- emoção- comportamento.
Quando uma pessoa tem uma avaliação negativa da imagem corporal interna, ele influencia a representação externa da aparência. Procura-se ensinar padrões eficazes e realistas de interpretar o corpo, aumentar a auto estima e as competências sociais, transformar o perfecionismo num imperfecionismo eficaz, aprender a lidar com a desaprovação, gerir emoções negativas e reduzir a ansiedade, etc.
Erros comuns a corrigir são o pensamento tudo ou nada (“ou tenho o corpo perfeito ou não valho nada), a leitura mental (“estão a pensar que sou um fraco”; os outros têm má opinião do meu corpo”) e a catastrofização (“ se não tiver x kilos de muscúlo, é horrível e insuportável”; “Sinto-me fraco, defeituoso ou inferior”)
Para saber mais:
– Ler entrevista com Fernando Magalhães, sobre este tema no Portal MSN saúde
– Entrevista sobre Vigorexia publicada na Notícias Magazine
Bibliografia Básica:
– Pope HG Jr, Phillips KA, Olivardia R: The Adonis Complex: The Secret Crisis of Male Body Obsession. New York, Free Press, 2000