Existem uma série de mitos e estereótipos sobre a atividade do psicólogo, que vou procurar desmontar e esclarecer neste artigo.
Um dos mais comuns é a associação do psicólogo a problemas mentais graves, porque viram “psis” em filmes ou séries, ou é mostrado o estereótipo da conversa de divã, sobre uma infância terrível. Mas não é bem assim…
O psicólogo, pelo menos na minha forma de atuação, compreende e enquadra a situação numa perspetiva científica, ensinando estratégias para lidar com os problemas atuais, ajuda a interpretar as situações de forma mais flexível, construtiva e proactiva. O psicólogo também ajuda a atingir objetivos pessoais e profissionais ou a gerir o stress, sendo o mais qualificado para o coaching, pois tem a compreensão mais profunda do funcionamento psicológico. Na minha abordagem cognitiva- comportamental, é importante fazer a conceituação de caso, onde elaboro várias hipóteses sobre o funcionamento psicológico do cliente, de forma colaborativa. Aqui incluem-se as influências educacionais, parentais, fatores biológicos e sociais. Este trabalho é feito numa sala com cadeiras e uma mesa, pois há exercícios para realizar, de papel e caneta. Muitos dos exercícios são feitos na mesa, para ajudar à mudança da forma de pensar e de gerir as emoções. Não existe um divã.
Ir ao Psicólogo é sinal de inteligência e autoestima, pois vai melhorar o seu autoconhecimento e saúde mental (ou lidar com problemas quotidianos). É sinal de estar consciente de si (e não “maluco”). Pode falar de questões mais simples até àquelas que provocam mais sofrimento, como fobias e pânico.
Quase todas as pessoas sentem como um alívio, quando sentem que psicólogo compreende o que está a sentir. Deixam-se de sentir estranhas ou únicas. É um hábito saudável ir a um profissional de saúde mental, tal como ir ao dentista. São tudo profissões ligadas à saúde. Também é normal sentir estranheza ao partilhar a sua vida, mas ao fim de algum tempo esta sensação desaparece. Também há pessoas que acham devem esconder pensamentos absurdos, quando quase todos os seres humanos têm pensamentos disparatados, que não devem levar a sério, em especial no transtorno obsessivo- compulsivo.
Um psicólogo não vai “julgar” os seus problemas, mas ajudá-lo a ganhar outra visão da vida, ganhando confiança e liberdade para tomar decisões. Ele existe precisamente para a compreender. Ajuda-o a perceber que afinal, os seus problemas são comuns a outras pessoas, que não tem de ficar isolado ou suportar tudo sozinho. O psicólogo dá-lhe uma perspetiva imparcial, que os amigos ou família não conseguirão. O importante é sentir empatia com o Psicólogo, que lhe transmite confiança e que é conhecedor dos problemas e que se identificou com a sua abordagem.
Um mito comum é que o psicólogo vai receitar uma montanha de medicamentos ou que só há solução em antidepressivos para o resto da vida; há a velha ideia de psi é igual a receitar drogas. Mas o psicólogo não receita medicamentos, mas ajuda-o a perceber como aprendeu uma visão negativa de si e do mundo; ajuda- a identificar e a transformar as crenças negativas na base da depressão e a ganhar motivação para socializar, ter passatempos, pensar de forma otimista sobre o mundo e sentir autoestima. Os psicólogos podem recomendar um médico psiquiatra, quando necessário, que pode receitar a medicação. No início da psicoterapia, em alguns casos, um antidepressivo pode ser útil pois ajuda à ativação do comportamento. Mas o objetivo da psicoterapia é ensinar a gerir de uma forma construtiva e autónoma as emoções e as situações de vida, de forma a que não dependa de antidepressivos. É com a mudança da forma de pensar e de agir que temos um humor positivo sustentável- é isto que se promove na psicoterapia.
Outro mito é de que as as consultas são muito caras ou que associam o psicólogo a anos passados no divã; há o estereótipo do psicólogo distante com sessões todas as semanas durante muito tempo.
Na realidade, o valor médio de uma consulta ronda os 60€ em 2024 e é atualmente comparticipado por vários seguros de saúde, e muitas pessoas sentem um benefício grande com 10 a 20 sessões de terapia cognitiva- comportamental. Nesta abordagem, mais rápida e eficaz, centramo-nos nos problemas atuais e em aprender estratégias de base científica. A terapia não costuma demorar anos, mas alguns meses.
A terapia cognitiva é mais eficaz a longo prazo porque ensina estratégias que podem ficar para a vida, tem um lado muito didático, com a sugestão de livros, textos e vídeos que poderá recorrer quando necessário; usar apenas medicação tem um efeito mais curto, que se pode tornar mais caro a longo prazo, pois poderá ter mais recaídas e voltar à medicação.
Outro mito é que ir ao psicólogo é sinal de fraqueza. Há pessoas que associam vulnerabilidade emocional e dificuldades psicológicas como algo que não deveriam ter. Há o mito do macho alfa, que tem de estar sempre forte e resiliente. Mas ser humano é ter vulnerabilidades; da mesma forma que vai a um médico, deverá consultar um psicólogo se sentir dificuldades a nível psicológico. Somos mais fortes quando aceitamos receber ajuda; quando reconhecemos as nossas vulnerabilidades e erros, mais rapidamente vamos aprender com as situações e com a ajuda de um profissional. Muitas pessoas dizem-me “porque não fui antes?!” ou “porque andei a evitar a terapia tantos anos?”. Deixe sentir a resistência e marque a consulta e vá. Não espere até ficar confortável. Isso só vem depois.
Outro mito comum é acreditarem que “Já sei tudo sobre o meu problema e o psi não me vai ajudar”
É a ilusão que são sempre autossuficientes e que mais ninguém irá perceber ou ajudar. Ou que já leram tudo no google. Mas muitas vezes estamos dentro da nossa própria bolha de pensamentos e fechamo-nos para outras possibilidade e interpretações. Tal como um dentista não tira um dente a si próprio, quando expõe a situação a um profissional, irá ter uma visão diferente e perceber os passos a dar. Este mito reforça-se em pessoas que passam anos a investigar e a tirar conclusões erróneas sobre si.
Uma visão exterior é sempre diferente e mais ampla do que a sua própria perspetiva. Se não conseguiu mudar, é bom estarmos predispostos a outras possibilidades. O psicólogo deve sugerir um plano de terapia gradual, no qual sente os degraus que poderá percorrer. Também não deve imaginar uma mudança mágica numa consulta, isso não existe. Precisamos de tempo para processar e praticar novos hábitos e atitudes!
Outro mito é acreditar que “não quero falar dos meus problemas com um desconhecido”. É normal sentir estranheza ao partilhar a sua vida; Aceite o processo de terapia como uma aprendizagem gradual, uma relação interativa, como tirar a carta de condução. Parece estranha ao início, mas notará com a prática os pequenos ganhos. Aceite que terá de trabalhar e sentir desconforto, mas terá um prémio enorme de crescimento e de liberdade pessoal! Também sentimos isto da primeira vez que conhecemos alguém, e que por vezes algumas pessoas tornaram-se as nossas melhores amigas.
Para saber mais: Terapia Cognitiva